As relações já tensas se agravaram quando o dignitário libertou no final do ano 12 presos do surto social de 2019 e Jorge Mateluna, ex-militante da Frente Patriótica Manuel Rodríguez.
Irritados com essa decisão, a coalizão de direita Chile Vamos e o Partido Republicano de extrema-direita decidiram se retirar das negociações para chegar a um acordo que lhes permitisse enfrentar a delinquência e o crime organizado.
Questionado sobre o assunto pela Prensa Latina, o analista político Nicolás Romero, diretor da revista De Frente, explicou que -antes de tudo- o indulto é uma atribuição constitucional dos presidentes.
Neste caso, foi aplicada a pessoas condenadas por tribunais chilenos por crimes cometidos no contexto dos motins de 2019 e, para Mateluna, submetidas a um processo muito irregular com extensos registros que mostram que foram vítimas das circunstâncias. Romero lembrou que no governo direitista anterior de Sebastián Piñera, centenas de indultos foram concedidos sob o argumento da Covid-19, e até violadores de direitos humanos foram libertados durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).
“Se na época a direita invocou razões humanitárias para pular as convenções internacionais que proíbem a anistia para os condenados por crimes contra a humanidade, então não cabe questionar a iniciativa constitucional do presidente Boric”, declarou Romero.
Em segundo lugar, explicou, o indulto é uma promessa de campanha do presidente, que no início de seu mandato desistiu de 223 processos movidos pelo governo anterior contra participantes das manifestações iniciadas em outubro de 2019.
Em seu ataque ao governo por essa decisão, os setores conservadores, além de deixar a mesa de negociações sobre o acordo de segurança, ameaçaram com uma acusação constitucional contra a ministra da Justiça, Marcela Ríos, e até mesmo contra o presidente.
Romero considera que neste ponto há uma divisão. Existe, disse, uma direita mais dura, ligada ao pinochetismo e ao Partido Republicano, que é pela desestabilização do Governo e – aliás – já o fizeram durante a recente greve dos caminhoneiros.
Existe outro setor, mais tradicional, alinhado aos interesses dos empresários, que precisam de maior estabilidade para seus negócios e isso envolve a continuidade do executivo boricista, e por isso não são a favor do processo contra o presidente, nem com o abandono do acordo para chegar a uma nova carta magna.
A última pesquisa da empresa Criteria, realizada no período em que o indulto foi anunciado, mostra um aumento de cinco pontos na aprovação da gestão do presidente para chegar a 35%, número ainda baixo.
Referindo-se ao assunto, o diretor da Revista De Frente lembrou que parte da queda de popularidade de Boric nos últimos meses está ligada à derrota da opção Aprovação no plebiscito de um novo projeto de constituição e à incapacidade do Governo de levantar suas próprias bandeiras.
No entanto, disse, naquele referendo quatro milhões de pessoas votaram a favor da mudança e é muito possível que muitas delas também simpatizem com o indulto, uma questão muito transversal e profundamente sentida por uma parte da população.
Segundo seus critérios, essa medida consegue fortalecer o governo e reconquistar a confiança dos setores progressistas e da esquerda.
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